Também nós queremos que o Espírito Santo nos conduza ao deserto! Na tradição bíblica, como nos primeiros séculos da Igreja, o deserto é considerado um lugar especial de encontro com Deus: “Por isso a atrairei, conduzi-la-ei ao deserto e falar-lhe-ei ao coração” (Os 2, 16). 

Ir ao deserto com Jesus durante este tempo de Quaresma – ou outro tempo que você mesmo eleger (não necessariamente a Quaresma) – é colocar-se no firme propósito de ter um encontro com Deus e com nossa própria verdade. O deserto não é um lugar, mas uma disposição espiritual. 

Os “demônios” que precisamos enfrentar estão, antes de tudo, dentro de nós. São nossas próprias inclinações, atitudes, traços de personalidade, que precisam ser reconciliados ou até mesmo vencidos, “exorcizados” para vivermos sob a Vontade de Deus. 

Uma batalha que se trava no decorrer de toda a vida. Sempre precisaremos de mudança, de conversão. Ninguém se sinta pronto por ter percorrido um determinado trecho de sua senda espiritual. Sempre haverá a necessidade de se colocar novamente a caminho, de se confrontar, de mudar, de crescer. É tarefa de uma vida inteira. Até porque não é só em vista de nossa evolução pessoal, mas em favor do outro, havendo, assim, sempre algo a corrigir ou confirmar. 

É preciso ainda lembrar que, sem a graça de Deus, toda ascese (disciplina espiritual) é vã. A iniciativa é de Deus! É o Espírito Santo quem conduz Jesus ao deserto. “Porque é Deus quem segundo o seu beneplácito, realiza em vós o querer e o executar.” (Fp 2, 13)

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Entre no deserto! Mas entre com a determinação de abrir-se à Palavra e à Graça de Deus. Ninguém julgue estar pronto para essa empreitada por si mesmo. Não temos que provar nada a Deus. Não temos que “obrigá-lo” a fazer algo por nós, pois suas ações em nosso favor são sempre amorosas. O jejum é uma prática voltada para nosso crescimento e não para um Deus que exige sacrifício. Jesus já realizou o único e definitivo sacrifício, oferecendo-se por todos nós na cruz (Hb 10, 10). 

Os 40 DIAS nos lembram os 40 dias que Jesus esteve no monte das tentações. O tempo dedicado ao jejum é reservado para buscar o Senhor, mesmo em meio às atividades cotidianas. Em Mt 6, 1-18, vemos como Jesus indica o jejum, a oração e a esmola (a solidariedade com os mais pobres) como sinais característicos da vida de um cristão fiel. Em alguns momentos de decisão, porém, somos convocados a intensificar nossa comunhão com o Senhor. 

Outro fator importante em um tempo de jejum é o propósito que nos move a fazê-lo. Um jejum sem propósito definido é como vagar num túnel escuro, sem saber de onde ou para onde se vai. Olhando as Sagradas Escrituras, encontraremos muitas razões que levaram as pessoas ao jejum. Se vamos jejuar temos que ter objetivos firmes e claros pelos quais lutar: 

– Estar com Deus; receber sua Palavra e alguma orientação concreta; interceder por alguém ou alguma situação; fortalecer-se no ministério que Deus quer confiar a você; enfrentar o “inimigo” e suas tentações, solidarizarmo-nos com os mais pobres etc. 

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Jejuaremos às SEXTAS-FEIRAS, durante o período de nosso Caminho Quaresmal, como estará indicado no roteiro à frente. Mas, durante os 40 dias, evite tudo aquilo que pode constituir-se em extravagâncias. Vamos escolher entre duas opções: 

– Iniciar a alimentação diária só a partir das 12h, ou simplesmente cortar uma das refeições do dia. 

Cuidado somente para não “descontar” na próxima refeição para compensar o que não foi comido. Pessoas que fazem uso de medicação devem estabelecer o jejum em conformidade com o horário dos remédios, bem como aquelas com problemas de pressão alta, diabetes ou outro tipo de limitação de saúde ou restrição alimentar podem fazer jejum de televisão, conversas ou outras coisas. Mas lembre-se: inicialmente o jejum consta de algum sacrifício na alimentação. 

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“Orai sem cessar!” (1Ts 5, 17) 

O que vem à sua mente quando você lê, ouve, estas palavras do apóstolo Paulo? Talvez, para os místicos, essa exortação lhes caia como um imperativo quase que natural, pois vivem mergulhados no mistério, ainda que, por tanto orarem, sintam que pouco oram ou nem sejam dignos de estar na santa presença de Deus. Mas, para nós, muitas vezes, orar é um desafio diário, uma luta – quando não, um fastio – diante dos tantos apelos externos e as tantas distrações que povoam nossa mente.   

Como, pois, acolher a exortação bíblica? Seria inalcançável? É algo só aplicável a um número limitadíssimo de iluminados? “Isso não é para mim! Eu não sou santo”, justifica rapidamente alguém. Todavia, a mesma Palavra diz: “Este mandamento que hoje lhes dou não é difícil demais para vocês, nem está fora de seu alcance. Não está guardado no céu, tão longe que vocês tenham de perguntar: ‘Quem subirá ao céu a fim de trazê-lo até nós aqui embaixo, para que possamos ouvir e obedecer?’. Não está guardado além do mar, tão distante que vocês tenham de perguntar: ‘Quem atravessará o mar a fim de trazê-lo até nós, para que possamos ouvir e obedecer?’. Não, a mensagem está bem perto; está em seus lábios e em seu coração, para que possam obedecer” (Dt 30, 11-14). 

Se assim está  declarado no Antigo Testamento, quanto mais para nós, hoje, ela se faz verdade, haja visto que o céu chegou até nós e os mares foram transpostos, pois Deus assumiu nossa humana natureza, tocou nossa história, percorreu nossas sendas, na Pessoa de Jesus. E como se não bastasse, Ele nos comunicou o Espírito Santo como Mestre interior: “Eu pedirei ao Pai, e Ele lhes dará outro Consolador, o Espírito da verdade, para ficar com vocês para sempre. O mundo não pode receber esse Espírito porque não O pode ver, nem conhecer. Mas vocês O conhecem porque Ele está com vocês e viverá em vocês” (Jo 14, 16-17).  

Perceba, portanto, que a ordenança do Apóstolo Paulo não é algo impossível de viver. Primeiro, porque é Graça e a Graça está sempre disponível: é uma fonte que nunca deixa de correr. Por outro lado, exige abertura e correspondência de nossa parte, pois orar não é natural: é sobrenatural! No entanto, é um caminho que pode e deve ser percorrido. Não faltarão as dificuldades, tentações, desvios e propostas de atalhos, mas, ao percorrê-lo, mantenha sempre no seu coração “O Caminho”: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14, 6).  

Durante quarenta dias, irei meditar com vocês, de uma forma muito simples e despretensiosa sobre a “Vida de Oração”. Não me apresento como mestre ou professor; apenas como um irmão que também é desafiado, a cada dia, a prosseguir nessa estrada e a perceber que tudo está impregnado da presença do Eterno e que, sim, é possível “orar sem cessar”, não como algo a fazer, mas a ser. 

Sejam esses dias do nosso “Caminho Quaresmal” um pequeno ponto de luz, dentro da conclamação que o Santo Padre, o Papa Francisco, nos faz para viver o Ano da Oração, preparando-nos para o Grande Jubileu a ser celebrado em 2025. 

A cada dia irei dar uma pista de meditação e também destacar alguma meditação do livro “A Oração”, de Santo Afonso Maria de Ligório, fundador da Congregação do Santíssimo Redentor. Nosso pai fundador é conhecido como “Doutor da Oração” e certamente tem muito a nos ensinar sobre esse “orar sem cessar”. Sobre esse livro, ele mesmo escreve, logo na Introdução: “Publiquei várias obras espirituais. Penso, entretanto, não ter escrito obra mais útil do que esta, na qual trato da oração, porque a oração é o meio necessário e certo de alcançarmos todas as graças necessárias para a salvação. Se me fosse possível, faria imprimir tantos exemplares deste livro quantos são os fiéis de todo o mundo. Daria um exemplar a cada um, a fim de que todos pudessem compreender a necessidade que temos de orar para nos salvar.”  

Que Maria, a Mãe do Belo Amor, Mestra na Oração ajude a abrir-nos à Graça da Oração e a percorrer esse caminho de intimidade com Deus. 

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Junto ao Papa Francisco, rezaremos a oração do Jubileu 2025, alimentando a esperança e a transformação espiritual que queremos empreender nesse Tempo Quaresmal:

Pai que estás nos céus, a fé que nos deste no teu filho Jesus Cristo, nosso irmão,
e a chama de caridade derramada nos nossos corações pelo Espírito Santo
despertem em nós a bem-aventurada esperança para a vinda do teu Reino.

A tua graça nos transforme em cultivadores diligentes das sementes do Evangelho
que fermentem a humanidade e o cosmos, na espera confiante
dos novos céus e da nova terra, quando, vencidas as potências do Mal,
se manifestar para sempre a tua glória.

A graça do Jubileu reavive em nós, Peregrinos de Esperança,
o desejo dos bens celestes e derrame sobre o mundo inteiro
a alegria e a paz do nosso Redentor.

A ti, Deus bendito na eternidade,
louvor e glória pelos séculos dos séculos.

Amém.


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Padre Sérgio Luiz e Silva
Natural de Juiz de Fora, formado em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora e em Teologia pelo ISI (Instituto Santo Inácio) de Belo Horizonte. Padre, membro da Congregação Redentorista. Tendo atuado como missionário na região de Montes Claros, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Juiz de Fora. Atualmente, é pároco na Paróquia Santo Afonso, no bairro Tijuca, no Rio de Janeiro. Radialista, já atuou nas Rádios Carioca e Catedral (Rio de Janeiro), América (Belo Horizonte), Catedral (Juiz de Fora). Atualmente, apresenta programas nas Rádios Catedral do Rio de Janeiro e Juiz de Fora. É autor de seis livros e diversas publicações.